segunda-feira, 3 de outubro de 2016

A Montanha e eu


O passado não existe, foram apenas pontos da nossa linha da vida que existiram, o passado é o que nos fez o que nós somos hoje. O presente é apenas um ponto, uma fronteira entre o passado e o futuro. O presente é um ponto infinitesimamente pequeno, tão pequeno que na prática não existe, porque quando acabaste de o sonhar já passou. E o futuro é o caminho que desejas trilhar. O futuro é o teu verdadeiro Eu.

O que transforma o ponto numa linha, o que lhe dá continuidade, o que transforma o presente num vector o que lhe dá um sentido, é o futuro, é o sonho que faz com que o ponto se repita, uma e outra vez. O presente é a passada, mas é o sonho que a transforma numa maratona.
A única coisa que existe é a montanha, o que existe é a raiz onde vais torcer o pé, a subida que me faz doer os músculos das pernas, a arvore que me dá a sombra que me abriga, o rio que te vai encharcar os pés, os ramos que abraçam a humidade das nuvens, os gravetos que me rasgam as pernas, o vento que me fustiga o corpo, a rampa que me faz sentir o coração a rebentar por dentro.
Mas a montanha não existe por si só, por estar ali. A montanha existe por que existe o sonho de a subir. Sem sonho, sem expectativas  a montanha ser-me-ia completamente indiferente. E é quando chegas ao cume, a arfar e páras para contemplar a montanha, a sentir o sangue a bombear forte em todas as tuas artérias, e o oxigénio no cérebro, que te sentes vivo morrendo.

Aí, sozinho, esmagado entre a terra e o céu, descobres que o cume da montanha, com todas a toneladas de terra e pedra que tem por baixo, com todos os seus rios e florestas, com toda a beleza que consegues ver, ouvir, cheirar e sentir, existe. Existe mas não à tua volta, existe e sempre existiu dentro de ti. É no cume da montanha, com a melhor companhia do mundo - a tua, que descobres os sonhos que te viram nascer.


 
 
 

 

 

domingo, 18 de setembro de 2016

O Amor dos Velhos É Ridículo






 

Sentado no carro, no parque de estacionamento do Estádio Nacional, espero os meus companheiros de corrida. A poente o dia vai adormecendo lentamente. À minha frente os ramos dos eucaliptos valsam indolentemente ao ritmo dos últimos ventos de verão. Abaixo de mim, estaciona um carro com dois septuagenários a bordo. O que fazem dois idosos num parque tão recôndito? O Amor dos Velhos é Ridículo!

 

Ele sai primeiro do carro e devagar, com dificuldade de locomoção dá a volta pela parte da frente, com uma enorme delicadeza abre a porta à senhora, e estende-lhe a mão com ternura. O Amor dos Velhos é Ridículo!

 

No parque de estacionamento começam a andar de forma muito vagarosa, ao lado um do outro. Ele de fato de domingo, ela de toillete completa, com saia por baixo dos joelhos. Ele impecavelmente penteado com brilhantina para trás e ela de cabelo armado. Os dois oferecem ao outro o melhor de si mesmos. Passeiam de mãos dadas por cima do empedrado desnivelado, ainda tropeçam. Penso: O Amor dos Velhos é Ridículo!

 

Não podiam ir passear para outro sítio? Noutro sitio mais plano, mais seguro? Para o Jardim com o regato ou o mini golf, ou para a marginal, parece que têm alguma coisa a esconder, se calhar têm! Mas esconder de quem? dos filhos? se calhar não são casados, e não querem mostrar se os filhos dele, ou aos dela. Tem vergonha de si próprios com aquela idade. Penso: O Amor dos Velhos é Ridículo!

 

Toda a gente sabe que com aquela idade já não se podem apaixonar. Agora vão namorar com aquela idade... de mão dada. Penso: O Amor dos Velhos é Ridículo!

 

Será que são amantes, escondendo o seu amor secreto? É que parece pelo comportamento deles. Penso: O Amor dos Velhos é Ridículo!

 

E agora ele passa para a frente dela, segura-lhe as mãos e beija-a! Beija-a na boca. Que ridículo! Penso: O amor dos velhos é ridículo.

Já sei, a vida são instantes, cada um deles é único. Temos de nos lançar porque senão quando damos por eles já passaram, são memórias ou arrependimentos. Será que a experiencia dos setenta e tal anos, já lhe diz quando se lançar e quando ficar? Ou é sempre como da primeira vez? Lançar-se de cabeça. Penso: O amor dos Velhos é Ridículo, Ridículo, Ridículo! Quem me dera um Amor Ridículo, Ridículo como o dos Velhos!

domingo, 11 de setembro de 2016

Treino de Fim de Semana - Preparação para a Ultra




Depois de umas semanas de férias onde o ócio estival foi lentamente penetrando no meu interior, como se o efeito acumulado de exposição ao calor me tivesse criado dentro de mim um molusco invertebrado que me aprisionava os membros e musculos, e tendo em vista a minha primeira Ultra, resolvi regressar a esse ventre de muitos corredores de trail: A Barragem do rio da Mula.

Pelo caminho tinha apanhado o Eduardo, e o nosso objectivo para o dia não era ambicioso, tornar a pôr as pernas a funcionar, ao ponto de doerem durante a semana, isto é entre 15 a 20 kms e cerca de 600 metros de altimetria.

No carro viamos a Serra a vir até nós vestida com um manto branco que, de tão justo me seduzia com todas as curvas do seu corpo.

Comecei como (quase) sempre, dando a volta à barragem, subindo o trilho das pontes, um dos meus preferidos, e depois entrando nos estradões que vão desembocar no cume da pedra amarela. Pelo caminho, e de repente entrei numa bolha dentro universo feerico, eu e as arvores abraçados pelas nuvens baixas. A contraluz, as teias de aranhas pareciam tecidos com fios de pérolas.


A humidade acumulava-se nos ramos, nas folhas, até ser grande o suficiente para formar gotas de desafiar a gravidade e fazer chover... era estranho que esta chuva formada à minha frente, só escolhesse algumas árvores para fazer a sua aparição fora de época.

Num esforço final chegamos à Pedra Amarela, um dos pontos altos de muitos dos meus treinos e ao olhar para nascente, os meus olhos repousaram num (vale de) lençol(is) de nuvens que deslizava(m) lentamente pelo corpo / silhueta da serra abaixo, (que ao descer) era perfurados pelos picos da serra, distinguindo-se ao longe os dois torreões do Palácio da Pena que perfurava aquela imagem de paz.

Recuperei as forças e parti para o próximo ponto do treino: A Peninha, passando pelas duas irmãs, subimos à peninha para outro miradouro sobre o Tejo, Montejunto, O Guincho, a anta de Adrenunnes.

Descemos para espreitar a vista do Cabo da Roca e falamos sobre o Trilho das Viuvas. Eduardo: Estava a pensar não fazer o trilho das viuvas hoje, deixavamos para outro dia não? Zé: Sim tens razão, é divertido ir a correr por ali abaixo, mas se o fizermos fazemos quilometros a mais, metros a mais de altimetria e passamos a semana toda com as pernas a doer. O mais sensato é voltar para trás...

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Ok, aí vamos nós downhill... DESCIDA TÉCNICAAAAAAAAAAAAAaaaaaaaaaaaaaa!!!

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Depois da euforia, contemplamos seriamente a subida. Afinal de contas tinha de haver um preço a pagar por tamanha alegria. Calmamente o alcatrão levou-nos por um tunel mágico de luz e brumas até um abastecimento nas pedras gémeas e depois para os Capuchos.


Lá em cima, uma troca de palavras breves com uns BTTistas e voltamos a descer para o Trilho das Pontes para uns minutos de divertimento final e depois para a Barragem.



O relógio gritava-nos que apenas tinhamos feito 17 kms, e como quem faz 17 faz sempre 20, atravessámos a estrada e passamos pela primeira vez à descoberta da Quinta do Pisão, mas só um bocadinho. Fica para a próxima...

 

 
 
 
 
 
 

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Dieta I - Um novo caminho






Ainda a manhã não tinha lavado as ramelas do Sol quando entrei numa cozinha que se encontrava lavada numa luz fraca. Abri o frigorifico, tirei o iogurte magro, juntei com uma boa porção de flocos de aveia e, levando a colher à boca, enchi-a de uma massa grossa e sensaborona, mastiguei-a, senti-a difícil de engolir. lentamente os flocos vão libertando o sabor da Aveia, que surpreendentemente começa a ser agradável. Será que o sabor diário da minha vida ia ser aquele bolo sensaborão?

Açucares não entram, e o doce que eu provava não se comia, sentia a minha gata a roçar a pedir o pequeno almoço, e ela não faz dieta. Abri o frigorifico, abri a lata de whiskeys saquetas, despejei o interior na tijela, chamei-a bichanando e fiz-lhe uma festa, enquanto os seus bigodes felinos roçavam nos meus dedos repletos de doçura e mel.

Arrematei o pequeno almoço com um café. Um café sem açúcar, o futuro irá trazer-me um despertar sempre tão amargo?

Pouco a pouco vou perdendo peso, pouco a pouco vou aprendendo a comer melhor. Ainda estou a 3,5 quilos do meu objetivo. É o meu desafio! Não pensem que queira emagrecer por qualquer questão estética ou para sedução do sexo oposto, Os desafios que se aproximam vão exigir um Zé& Mi mais atléticos para suportar subidas e descidas de montanha.

Para isso comecei por ir a um nutricionista desportivo que me passou a dieta em função da carga de treinos semanais. O que comer antes de um treino? que tipo de treino? se de corrida? se de ginásio? o que comer para facilitar a recuperação? o que comer para controlar os açucares e consequentemente o humor e o apetite.
O meu corpo tornou-se uma máquina digestiva com muita aveia, iogurtes magros, litros de água (com 12 gotas de limão), queijo fresco, frutos secos, chocolate negro (70% de cacao) e atente-se à piéce de resistance:
- bolachas de milho sem sal, sem açúcar, sem glúten, sem corantes, sem conservantes, sem graça...

Mas por outro lado, a gastronomia é uma das minhas paixões... por agora platónica ou vou encontrar um espaço para a amar? A ver vamos

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Apresentação





Bem-vindos



Todas as viagens, todas as corridas, todos os caminhos começam num kilometro zero. Quem num momento da sua vida viu todo o seu chão desfazer-se debaixo dos seus pés  e quando se levantou descobriu que os caminhos que antes tomava como certos se esvaíram, revelando um deserto seco à sua volta. O passado é apenas aquilo que nos fez quem somos hoje.


É tempo de nos erguermos dar um passo em frente na direcção que nos diz o coração, deixar a poeira assentar e descobrir cá dentro os sonhos e as paixões que nos hão de levar em frente.

Trilhando caminhos que teremos de trilhar sós, que por agora podem não parecer caminhos mas que, iluminados pela luz que nos vai dentro, nos hão de levar acima das estrelas. O presente é apenas um ponto de intersecção entre um passado que já não é, e um futuro com o qual passamos o esse ponto a sonhar.

"... O problema reside no facto de o homem ser um animal moral abandonado num universo amoral e condenado a uma existência finita e sem outro significado que não seja perpetuar o ciclo natural da espécie. É impossível sobreviver num estado prolongado de realidade, pelo menos para o ser humano. Passamos boa parte das nossas vidas a sonhar, sobretudo quando estamos acordados.

Carlos Ruiz Zafon in O Jogo do Anjo,

É o que este blog vai ser, não tanto um relatório de provas e treinos, mas um diário de momentos e emoções, de quem se distribui por várias paixões (corrida, trail, dança, leituras, escritas, viagens, pessoas).